segunda-feira, 15 de agosto de 2011

A Crise (...do abigeato)


São tantas as conseqüências da atual crise econômica, que seria um desperdício enumera-las, pois já a sabemos quase todas de cor... Mas, não poderia deixar de referir a originalidade de uma – rara em seu conteúdo e quase dramática em sua forma.
Um especialista em crises, passeando nas proximidades da ficção, relata um caso absolutamente insólito e rigorosamente preocupante. Conta-me que, numa dessas esquinas da vagabundagem, ouviu, de passada, um diálogo surpreendente de dois conhecidos e reconhecidos abigeatários profissionais.
-         A coisa está difícil, compadre.
-         Difícil é apelido...
-         Que crise bem braba!...
-         Brabíssima!
-         Já não sobra mais nada...
-         As vezes até falta...
-         Imagine, que da última vez tive de tirar do próprio bolso para completar o serviço (!??)...
-         Não me diga!
-         Sim – paguei a gasolina, o conserto do carro (que estradas ruins!), a comissão dos tropeiros, o frete do caminhão, a taxa de embarque, a licença do transporte, a insalubridade, a periculosidade, a gorjeta dos olheiros, o pastoreio, o imposto fiscal e por aí vai...
-         Ué, tu paga tudo isso???
-         Claro. Comigo é tudo na legalidade. É mais seguro. Não gosto de me incomodar...
-         Bueno, aí fica complicado...
-         E mais – agora, “o cara aquele” quer prazo...
-         Mas paga um jurinho, pelo menos???
-         Que nada – quer tudo na moleza.
-         Essa gente tá ficando muito abusada...
-         Abusada e atrevida. Na semana passada, disse que ficava só com a carne de primeira. Era pegar ou largar...
-         E tu pegaste???
-         Que remédio...???
-         Isso é uma barbaridade!!!...
-         É, compadre, ninguém mais respeita o trabalhador...
-         É verdade.
-         É sim. Acho que vou trocar de ramo.
-         O que pretendes???
-         Não sei ainda. Acho que vou pegar uma dessas bocas que andam por aí...
-         Não me diz que vais te meter na política???
-         Que nada – essa também não está dando nada, atualmente.
-         Então, que boca é essa???
-         Vou fiscalizar os roubos.
-         Mas, como???...
-         Isso mesmo – vou oferecer meus préstimos para cuidar dos interesses dessa turma que vive se incomodando com o abigeato.
-         Que turma?? – a dos proprietários ou a dos “trabalhadores”??
-         As duas. Ora uma, ora outra. A que pagar melhor eu fico.
-         E se não der certo??
-         Vai dar...
-         Mas, se não der??
-         Aí, então, eu entro numa dessas filas de sem-terra e estou feito na vida.
-         Mas isso dá trabalho...
-         E tu queres casa, comida, roupa lavada e fama sem um pouco de incômodo???...
-         Ah, pois é...
-         Pois é.

Verossímel ou não, o relato comove e preocupa. Avaliar a crise brasileira pelas conseqüências práticas é tarefa que vai bem além das teorias economistas e das teses salvadoras. Parece que estamos de fato, num buraco sem fundo. É grave o problema quando nem mesmo o roubo é suficiente para a sobrevivência. Se o furto não dá, o que dará???...
Êta Brasil de guerra que sempre consegue reescrever a história com a pena do cocar do chefe...
Que chefe??
O pajé das mágicas e das mirabolâncias..., ora pois!...

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