quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Meu Compadre

Meu compadre é um homem de muitas dimensões: - calmo, reservado na medida do possível e possível na medida dos reservados; um homem vivo, esperto, dono do seu tempo, que sabe fazer apreciações inteligentes e oportunas; sempre sabe o que diz e diz tudo o que sabe; alegre e comunicativo não mede braços num abraço e não conta dedos que não tem. É franco, direto, puro, um  homem de lei! Sabe adoçar as horas mais amargas mas também é mestre em salgar os ambientes mais insossos. Dono de seu nariz – antigo e simpático nariz – que sente de longe o cheiro da mentira e do embuste.
Um sujeito livre por vocação e vocacionado por sua própria liberdade. Nada e ninguém encilha seu coração para esporear seus sentimentos
Acha que as ideologias, as doutrinas, os credos e outras faceirices do pensar e do sentir seriam desnecessárias  em um mundo mais repleto de certezas. Admite que há mais certeza nas coisas que não são do que nas que são. Ele, por exemplo, vive repetindo que, na verdade, não sabe bem o que é, o que sabe, o que tem e o que pretende, mas é capaz de saber de cor o que não é, o que não sabe, o que não tem e o que não deseja. Comenta, laconicamente, que para ser assim é preciso uma boa dose de humildade. Meu compadre não ostenta a chamada “falsa modéstia”.
Dia desses, provocado por um furioso e voluntarioso grupo moralista, instado a opinar sobre generalidades do mundo e dos mundanos, tais como livre-arbítrio, e outros quetais do gênero, falou firme e forte derramando sinceridade: - disse, só para citar, que o perdão é desnecessário onde não existe culpa; que não há licenças concedidas onde não há proibições; que não vê razão para justificar a bonança com a ameaça de temporais; que os remendos e os remendeiros são inúteis em um mundo sem rupturas. Que não é preciso confissões quando não há segredos e não há segredos onde não existem medos. E sem medos, para que preces?
Que é absolutamente sem sentido a “salvação” quando não há condenação. Que seria por demais gratificante se nosso denominado “livre arbítrio” nos guindasse a um mundo sem perdões, bonanças, remendos, confissões e preces de salvação porque assim, então, não teríamos as culpas, as rupturas, os temporais, os segredos, os medos, as condenações e uma porção de outras “cositas” que fazem da humanidade esse poço de piedade, lágrimas e escravidão.
Apesar de tudo acredita no mundo e nas pessoas. Acredita, fundamentalmente, em si mesmo. Filosofando costuma dizer que o mundo, porque é redondo, é uma realidade singela onde os extremos forçosamente um dia se tocam e por isso mesmo, todos chegaremos finalmente ao mesmo porto. Daí porque não devemos aceitar o  cabresto que nos força seguir para um lado só, em busca da felicidade.
Estou para ver homem de maior tino que o meu compadre. Nunca perde as estribeiras e sempre sabe achar o fio da meada. É a favor da vida e da sanidade. Crê na bondade, na gratidão e na dignidade das pessoas. Defende a igualdade de oportunidades e está sempre disposto a lutar, de camisa aberta, por causas que julga justas. E sobre “justiça” prefere agir mais do que falar, mas previne, dizendo que o “direito” pode promover a tolerância mas não necessariamente a amizade entre os homens.
Meu compadre é um mar de sabedoria e paciência. Sua fé, sua alegria e sua esperança são contagiantes. Seu passatempo preferido, em sua “cadeira de rodas” é tentar passar camelos em diminutos buracos de agulhas.
Ocupa seu precioso tempo nessa sutil tentativa, mas reclama, tempestivamente, pelo progressivo, inexorável (e inexplicável) aumento dos buracos...
Se não fosse cego, escolheria ser crítico de cinema, profissionalmente, e astrônomo nas horas vagas.
Gosto demais do meu compadre!
Amanhã mesmo farei um agrado a esse amigo: - mandarei a ele uma farta porção daquelas amêndoas que nasceram e cresceram na laranjeira lá do fundo do quintal...
E você que agrado seria capaz de proporcionar ao meu compadre?

Hein?

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