quinta-feira, 25 de outubro de 2012

A Lógica Castelhana


Aportei em Montevidéu por via rodoviária, em pleno fevereiro, transpirando por todos os poros. Na chegada, tentando driblar os percalços do conturbado trânsito urbano naquele fim de sexta-feira, sintonizei uma das emissoras locais para me inteirar das últimas. De pronto, a voz tonitroante de um polpudo locutor de ofício – e cantador de tangos, boleros e afins, nas horas vagas – dava conta de um bárbaro assalto ao Banco de La República, eivado de tiroteos com ruidosas metrajetas e similares. Os assaltantes eram dois e tiveram a má ideia de refugiarem-se em um prédio próximo de seis andares. A polícia, atenta e competente, seguiu-os até lá, num efusivo festival de bombas e balazos... Um dos meliantes quedou-se, finalmente, muerto por reagir à prisão... e o outro, lamentavelmente, jogou-se das alturas, passando desta para a melhor...
Na sequência Del noticiero policial surgia o caso de uma muchacha que havia desaparecido, misteriosamente, nas imediações do Cassino Carrasco. O desaparecimento da donzela era tão misterioso que as fontes oficiais estavam preferindo sugerir tratar-se de um caso raro com a participação inequívoca de inoportunos Ets, pilotando furtivos objetos voadores não identificados...
Mais adiante o locutor/tenor relatava a história de um presidiário que havia conquistado alforria por conta e ordem do perdão natalino. Menos de uma semana de soltura foi preso novamente, flagrado em outra e grave contravenção. Preso de novo, para as devidas reprimendas, foi solto dias depois por determinação judicial. E mais uma vez voltou a delinquir, confirmando a triste e preocupante estatística da reincidência. O dito cujo cidadão de honradez imelhorável foi então trancafiado, definitivamente, para apreciar o sol quadrado pelo resto dos tempos...
Dois dias depois, fui fragorosamente multado por estacionamento indevido.
Paguei a multa sob protesto e botei a boca no trombone:
- En mi País no se hace esto con los turistas... sentenciei, alto e bom som, para a educada funcionária de la chefatura. Ela limitou-se a comentar:
- No confunda País com “Montevidéo”...
Não confundi e fui reclamar do guarda de plantão:
- Eu não sabia que aqui não podia estacionar...
O gendarme, imperturbável, proferiu autoritariamente:
- No saber será lo mismo que no leer... E bem acima do carro estava uma legível placa de no estacionar, sutilmente camuflada pelo denso, frondoso e refrescante galho de um plátano castelhano.
Em face de tantos sobressaltos, dúvidas e contratempos procurei o ombro amigo de Pablo, ilustre diretor de uma Emissora co-irmã.
Expus minhas razões, preocupações e contrariedades.
Pablo respirou sabiamente do fundo de uma gorda risada solidária e falou:
- Mire, Pascoal, las cosas son muy sencillas. Los muchachos asaltantes no fueran suficientemente competentes. Está visto... La muchacha misteriosamente desaparecida, hay que ver, tenía un novio...! El ciudadano de “honradez inmejorable” no tenía gusto por libertad. Y la punición que te aplicaran fue tremendamente injusta.
Así son las cosas, así es la vida... porque, em verdad, le digo: uma cosa es uma cosa, otra cosa es otra cosa... 

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