Aportei em Montevidéu por via
rodoviária, em pleno fevereiro, transpirando por todos os poros. Na chegada,
tentando driblar os percalços do conturbado trânsito urbano naquele fim de
sexta-feira, sintonizei uma das emissoras locais para me inteirar das últimas.
De pronto, a voz tonitroante de um polpudo locutor de ofício – e cantador de
tangos, boleros e afins, nas horas vagas – dava conta de um bárbaro assalto ao
Banco de La República, eivado de tiroteos
com ruidosas metrajetas e
similares. Os assaltantes eram dois e tiveram a má ideia de refugiarem-se em um
prédio próximo de seis andares. A polícia, atenta e competente, seguiu-os até
lá, num efusivo festival de bombas e balazos...
Um dos meliantes quedou-se, finalmente, muerto
por reagir à prisão... e o outro, lamentavelmente, jogou-se das alturas,
passando desta para a melhor...
Na sequência Del noticiero policial surgia o caso de uma muchacha que havia desaparecido, misteriosamente, nas imediações do
Cassino Carrasco. O desaparecimento da donzela era tão misterioso que as fontes
oficiais estavam preferindo sugerir tratar-se de um caso raro com a
participação inequívoca de inoportunos Ets, pilotando furtivos objetos voadores
não identificados...
Mais adiante o locutor/tenor relatava
a história de um presidiário que havia conquistado alforria por conta e ordem
do perdão natalino. Menos de uma semana de soltura foi preso novamente,
flagrado em outra e grave contravenção. Preso de novo, para as devidas
reprimendas, foi solto dias depois por determinação judicial. E mais uma vez
voltou a delinquir, confirmando a triste e preocupante estatística da
reincidência. O dito cujo cidadão de honradez imelhorável foi então
trancafiado, definitivamente, para apreciar o sol quadrado pelo resto dos
tempos...
Dois dias depois, fui fragorosamente
multado por estacionamento indevido.
Paguei a multa sob protesto e botei a
boca no trombone:
- En
mi País no se hace esto con los turistas... sentenciei, alto e bom som,
para a educada funcionária de la
chefatura. Ela limitou-se a comentar:
- No
confunda País com “Montevidéo”...
Não confundi e fui reclamar do guarda
de plantão:
- Eu
não sabia que aqui não podia estacionar...
O gendarme, imperturbável, proferiu
autoritariamente:
- No
saber será lo mismo que no leer... E bem acima do carro estava uma legível
placa de no estacionar, sutilmente camuflada pelo denso, frondoso e refrescante
galho de um plátano castelhano.
Em face de tantos sobressaltos,
dúvidas e contratempos procurei o ombro amigo de Pablo, ilustre diretor de uma
Emissora co-irmã.
Expus minhas razões, preocupações e
contrariedades.
Pablo respirou sabiamente do fundo de
uma gorda risada solidária e falou:
- Mire, Pascoal, las cosas son muy sencillas. Los muchachos asaltantes no fueran suficientemente competentes. Está
visto... La muchacha misteriosamente desaparecida, hay que ver, tenía un
novio...! El ciudadano de “honradez inmejorable” no tenía gusto por libertad. Y
la punición que te aplicaran fue tremendamente injusta.
Así son las cosas, así es la vida... porque, em verdad, le digo: uma cosa
es uma cosa, otra cosa es otra cosa...
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