quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Qual?...


         Numa das mansões da aristocracia riograndense recebia-se gente de vários rótulos. Gente importante, gente média e comum.                                                                                                                                                                                                                 
            A chefia da casa um dia chamou Aristotelino, um serviçal humilde, mas ativo, e recomendou: - Aqui estão duas roupas de recepção. A bege é para ocasiões comuns e a branca será para acontecimento de gala. Você deverá vestir uma ou outra conforme o momento. Esteja atento e seja educado!
            O mordomo improvisado saiu faceiro e foi guardar os ternos. Aristotelino – Lino, para os íntimos – estava vivendo seu momento de suprema glória.
            Na verdade, Lino era um próximo, muito próximo que nasceu e cresceu ali nas redondezas do Castelo. De família modesta, suficientemente ignorante, bom sujeito, inteligente e muito solícito, tinha recebido um leve traquejo para comportar-se entre excelências. Sabia carregar uma bandeja, abria portas, fazia mesuras, servia à francesa, carregava malas, enfim, era mordomo.
            Certa feita, chegou gente esquisita, vestindo chapéus estranhos. Lino avaliava o grau de importância das visitas olhando primeiramente os extremos – cabeça e pés. Aprendeu a reconhecer autoridades pelos sapatos e pelos chapéus. Dizia que os sapatos das pessoas importantes brilhavam mais e os chapéus brilhavam menos. O contrário, geralmente, denotava gente menos qualificada. Tal critério ficava rigorosamente por conta e risco do juízo de Aristotelino. Mas dessa vez estava difícil descobrir  quem era quem. O pessoal estava muito bem vestido, mas descalço. Um ou dois vestiam sandálias. E os chapéus? Bem, na verdade, não eram chapéus – eram turbantes, véus, panos ou coisa que o valha. Lino, indeciso, correu para o quarto e não sabia o que vestir, a bege ou a branca?... Desceu rápido e na primeira oportunidade perguntou em voz alta à dona da casa na frente das visitas: - Dona Eufrásia – a branquinha ou a pardinha...?
- A branca, Lino – disse, entredentes, Dona Eufrásia.
Depois desse incidente decidiu-se que Lino deveria usar sempre e para todos, o terno branco. Mudaria apenas a cor da gravata de tope. Preta para ocasiões solenes e vermelha para o cotidiano.
Um dia viu descer do carro um sujeito todo enlameado. Subiu e vestiu logo a gravata vermelha. Quando vinha chegando perto ouviu os donos da casa pronunciarem “excelência”. Deu meia volta e atou a gravata preta.
Quando se virou, viu e ouviu gargalhadas e tapinhas nas costas. É gente para gravata vermelha – pensou. Voltou à cena e viu as demais pessoas da casa fazendo demorada e solene reverência. É gente para gravata preta...
Estava, realmente, confuso. Não se aguentou, bateu no ombro da anfitriã e perguntou: - A pretinha ou a coloradinha?...
- “A preta, Lino...”
O homem embarrado era simplesmente o Barão do Rio Branco que chegava contando o contratempo que tivera em um atoleiro ali na chegada.
Aristotelino morreu mordomo, velhinho e curvado. Foi enterrado de branco.
E a gravata? Por via das dúvidas ataram as duas...
Nunca se sabe!...

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