Numa das mansões da aristocracia riograndense recebia-se
gente de vários rótulos. Gente importante, gente média e comum.
A chefia da
casa um dia chamou Aristotelino, um serviçal humilde, mas ativo, e recomendou:
- Aqui estão duas roupas de recepção. A bege é para ocasiões comuns e a branca
será para acontecimento de gala. Você deverá vestir uma ou outra conforme o
momento. Esteja atento e seja educado!
O mordomo
improvisado saiu faceiro e foi guardar os ternos. Aristotelino – Lino, para os
íntimos – estava vivendo seu momento de suprema glória.
Na verdade,
Lino era um próximo, muito próximo que nasceu e cresceu ali nas redondezas do
Castelo. De família modesta, suficientemente ignorante, bom sujeito,
inteligente e muito solícito, tinha recebido um leve traquejo para comportar-se
entre excelências. Sabia carregar uma bandeja, abria portas, fazia mesuras,
servia à francesa, carregava malas, enfim, era mordomo.
Certa feita,
chegou gente esquisita, vestindo chapéus estranhos. Lino avaliava o grau de
importância das visitas olhando primeiramente os extremos – cabeça e pés.
Aprendeu a reconhecer autoridades pelos sapatos e pelos chapéus. Dizia que os
sapatos das pessoas importantes brilhavam mais e os chapéus brilhavam menos. O
contrário, geralmente, denotava gente menos qualificada. Tal critério ficava
rigorosamente por conta e risco do juízo de Aristotelino. Mas dessa vez estava
difícil descobrir quem era quem. O
pessoal estava muito bem vestido, mas descalço. Um ou dois vestiam sandálias. E
os chapéus? Bem, na verdade, não eram chapéus – eram turbantes, véus, panos ou
coisa que o valha. Lino, indeciso, correu para o quarto e não sabia o que
vestir, a bege ou a branca?... Desceu rápido e na primeira oportunidade
perguntou em voz alta à dona da casa na frente das visitas: - Dona Eufrásia – a
branquinha ou a pardinha...?
- A branca, Lino – disse,
entredentes, Dona Eufrásia.
Depois desse incidente decidiu-se que
Lino deveria usar sempre e para todos, o terno branco. Mudaria apenas a cor da
gravata de tope. Preta para ocasiões solenes e vermelha para o cotidiano.
Um dia viu descer do carro um sujeito
todo enlameado. Subiu e vestiu logo a gravata vermelha. Quando vinha chegando perto
ouviu os donos da casa pronunciarem “excelência”. Deu meia volta e atou a
gravata preta.
Quando se virou, viu e ouviu
gargalhadas e tapinhas nas costas. É gente para gravata vermelha – pensou.
Voltou à cena e viu as demais pessoas da casa fazendo demorada e solene
reverência. É gente para gravata preta...
Estava, realmente, confuso. Não se
aguentou, bateu no ombro da anfitriã e perguntou: - A pretinha ou a coloradinha?...
- “A preta, Lino...”
O homem embarrado era simplesmente o
Barão do Rio Branco que chegava contando o contratempo que tivera em um
atoleiro ali na chegada.
Aristotelino morreu mordomo, velhinho
e curvado. Foi enterrado de branco.
E a gravata? Por via das dúvidas
ataram as duas...
Nunca se sabe!...
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