quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

UNANIMEMENTE ANÔNIMA...!




         Terêncio era uma figura humana quase curricular. Em todos os cantos, em qualquer roda, marcava sua presença sempre espirituosa. Na preguiça das tardes ou na eloqüência das noites, aparecia, capengante, para mudar a história ou confirmar o destino. Com o hábito, tornou-se indispensável nas reuniões mais corriqueiras ou nos encontros mais reservados. Às vezes não dizia nada. Apenas seu resmungo inconfundível (e intransferível) acusava sua densa e espalhafatosa presença. Outras vezes, era verborréico, ousado, filosófico e incomodamente intrometido. Estava sempre pendurado nas limosas beiradas do poder. Convivia, fraternalmente, com autoridades, com chefes políticos, com próceres, com líderes populares, com ciscunstantes estranhos, com artistas, malabaristas, bacharéis, coronéis, enfim – Terêncio estava sempre onde se desenhava a equação da decisão.
         Terêncio tinha o particular poder de aspergir um sutil comentário para catalizar o debate. Conhecia todo o mundo e sabia de tudo! Sabia da dinâmica sócio-política do lugar. Morava no hotel mas habitava a alma da cidade...
         Tinha ares de senador. Falava como profeta, andava como fariseu, invocava verdades magnânimas, filosofava em plena praça, bebia café em copo e formulava perguntas, engenhosamente, irrespondíveis. Terêncio era um ensaio vivo da lógica do absurdo... Era tudo e não era nada!
         Certa feita, presente em uma expressiva reunião política, sentiu-se encorajado a discursar. Homenageava-se, na ocasião, uma brilhante e insinuante liderança governamental, responsável por vários e brilhantes fatos e feitos na área da educação oficial. Depois de longa peroração elogiosa pela presença de tão ilustre autoridade, fez enfática pausa oratória e tonitroou, sem reservas: - “a ignorância governamental é unânime!...”
- O auditório colheu o constrangimento em silencioso sobressalto. Alguém puxou a manga do casaco de Terêncio, à guisa de reprovação, querendo mostrar que o próprio governo ali estava representado na figura do ilustre Secretário da Educação que, gentilmente, visitava a cidade. Terêncio, então, recompôs-se, engolindo, com veemência, a própria pausa para complementar: - eu me corrijo: - “a ignorância é unanimemente anônima”...
Até hoje, e pelos dias que virão, jamais saberemos se isso foi uma crítica ou um elogio (?)...
O fato é, que, depois disso, generosas verbas governamentais aqui aportaram para proveito de todos nós. E os proveitos  eleitorais não foram “unanimemente anônimos”...

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